O imbróglio entre o Congresso e o governo federal em relação ao Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) motivou uma nova guerra de informações e acusações nas redes sociais. De acordo com pesquisa divulgada pela Genial Quaest nessa sexta-feira (4/7), o Congresso é alvo de 61% das menções negativas sobre o tema, enquanto o governo responde por 11% delas. Outros 28% das citações foram neutras.
O “armamento” usado nessa guerra virtual entre Legislativo e Executivo são os vídeos gerados por inteligência artificial (IA). O Partido dos Trabalhadores (PT) usou os conteúdos feitos por IA para ilustrar o desequilíbrio na cobrança de impostos entre a população mais pobre e os “super ricos”.
Em um dos vídeos, o PT ilustra trabalhadores e empresários numa balança, onde cada um está de um lado. Na peça, é mostrado o desequilíbrio desta balança, onde os pobres pagam mais impostos do que os ricos. No decorrer do filme feito por IA, mudanças são apontadas como necessárias para fazer “justiça social”. Nesses vídeos, o slogan usado pelo PT foi: Taxação BBB: Bilionários, Bancos e Bets.



Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados
Reprodução/YouTube

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
Lula e Hugo Motta

Hugo Motta, presidente da Câmara
VINÍCIUS SCHMIDT/METRÓPOLES @vinicius.foto

Hugo Motta, presidente da Câmara
VINÍCIUS SCHMIDT/METRÓPOLES @vinicius.foto


O presidente da Câmara, Hugo Motta
Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados
A inteligência artificial já é uma realidade na política e, assim como ocorreu com outras tecnologias no passado, seu uso será inevitável nas próximas eleições, afirma Magno Karl, cientista político pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretor executivo do Livres. Ele destaca que, mesmo com possíveis regulamentações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), será difícil controlar como a IA será utilizada pela população, já que campanhas políticas hoje também são impulsionadas por eleitores de maneira individual nas redes sociais.
“Cada pessoa é um instrumento de irradiação de campanha política”, explica Karl, lembrando que, assim como fake news e deep fakes, a IA pode distorcer a realidade, mas não é um problema inédito, apenas mais complexo.
Nas eleições de 2026, a disputa entre esquerda e direita no ambiente digital deve se intensificar, mas com vantagens para a oposição, avalia o especialista. Karl analisa que enquanto a direita consolidou uma comunicação mais eficiente nas redes nos últimos anos, a esquerda, como governo, terá o desafio de defender um legado impopular.
“O problema é que a comunicação se pulverizou de certa forma, e o engajamento político também se pulverizou, de modo que realisticamente será muito difícil de controlar. Talvez o melhor que a sociedade e o Estado possam fazer pela sociedade, e a própria sociedade possa fazer por si mesma, na tentativa de educar os eleitores, seja ensinar uma abordagem de ceticismo em relação aos conteúdos que se vê na internet”, frisa Karl.
Congresso x governo
- Pesquisa Quaest aponta que o Congresso tem sido alvo da maioria das críticas nas redes sociais, após o agravamento da crise entre parlamentares e o governo federal em torno do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
- Desde o começo do embate direto entre Legislativo e Executivo, as menções ao Congresso tiveram 61% de críticas negativas.
- 28% das citações, conforme a Quaest, foram de manifestações neutras e 11% positivas aos parlamentares ou de ataque ao governo.
- O levantamento da Quaest coletou 4,4 milhões de publicações, nas redes sociais, entre os dias 24 de junho a 4 de julho deste ano. Foram acompanhadas as plataformas: Twitter (X), Instagram, Facebook, Reddit, Tumblr e YouTube, e sites de notícias.
- A pesquisa destaca que a campanha contra o Congresso ganhou força a partir do dia 25 de junho, ou seja, justamente após os parlamentares derrubarem o decreto assinado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o IOF.
Regulação
Para as eleições municipais de 2024, o TSE regulamentou o uso de IA na propaganda de partidos, coligações, federações partidárias, candidatos e candidatas. A resolução proíbe deepfakes, obrigação de aviso sobre o uso de IA na propaganda eleitoral, restrição do emprego de robôs para intermediar contato com o eleitor e responsabilidade das big techs que não retirarem do ar, imediatamente, conteúdos com desinformação, discurso de ódio, ideologia nazista e fascista, além dos antidemocráticos, racistas e homofóbicos.
Para o especialista em inteligência artificial (IA) e mestre em direito regulatório e políticas públicas pela Universidade de Brasília (UnB), João Ataide, o que está sendo visto na crise do IOF é uma prévia clara do que pode acontecer nas eleições de 2026. “Em 2018, tivemos o WhatsApp como canal de fake news; em 2022, vídeos fora de contexto. Agora, em 2026, a preocupação é com conteúdos falsos gerados por IA, muito mais realistas e convincentes”, analisa.
Ataide reconhece os esforços do TSE para conter a desinformação, mas ressalta o desafio da velocidade da propagação. “O TSE proibiu deepfakes na propaganda eleitoral e prevê cassação de mandato, mas a Justiça não consegue responder a tempo se a desinformação viralizar antes da remoção”, alerta.
O especialista da UnB também aponta que, embora ainda seja possível identificar vídeos falsos por falhas na boca, áudio ou qualidade, o avanço da tecnologia tende a dificultar essa detecção. “Estamos diante de um cenário não muito otimista”, conclui.
Avanço na IA
Vídeos gerados por inteligência artificial (IA) têm viralizado cada vez mais nas redes sociais, confundindo internautas com situações que parecem verdadeiras. As produções que mais repercutem são feitas com o Veo 3, um modelo de IA lançado pelo Google, que permite adicionar efeitos sonoros, ruídos ambientes e até diálogos solicitados pelos usuários.
Na visão do cientista político Nauê Bernardo Azevedo, o perigo provocado por eventual dificuldade entre um conteúdo real ou fake é concreto, no qual entende que as redes precisam contribuir com a devida rotulagem, “para impedir que os eleitores e eleitoras sejam vítimas de indução ao erro”.
“A tendência é que essas ferramentas fiquem cada vez mais sofisticadas. No entanto, mais do que a indução a erro, essas ferramentas poderão ser utilizadas para passar mensagens de forma mais difusa, visual e visceral. Os Poderes competentes precisarão agir de forma assertiva em relação ao preventivo e também ao repressivo, de modo que o mau uso dessas ferramentas seja desincentivado e punido”, declara.